1 Disse-lhes Jesus uma parábola sobre o dever de orar sempre e nunca esmorecer:
2 Havia em certa cidade um juiz que não temia a Deus, nem respeitava homem algum.
3 Havia também naquela mesma cidade uma viúva que vinha ter com ele, dizendo: Julga a minha causa contra o meu adversário.
4 Ele, por algum tempo, não a quis atender; mas, depois, disse consigo: Bem que não temo a Deus, nem respeito aos homens;
5 todavia, como esta viúva me importuna, julgarei a sua causa, para não suceder que, por fim, venha a molestar-me.
6 Então, disse o Senhor: Considerai no que diz este juiz iníquo.
7 Não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que a ele clamam dia e noite, embora pareça demorado em defendê-los?
8 Digo-vos que, depressa, lhes fará justiça. Contudo, quando vier o Filho do Homem, achará, porventura, fé na terra?Lucas 18:1-8
“Disse-lhes Jesus uma parábola sobre o dever de orar sempre e nunca esmorecer:”
Exegese:
Aqui, o evangelista Lucas, médico cuidadoso e escritor meticuloso, já nos oferece a chave hermenêutica da parábola: oração constante e perseverança. Jesus fala a Seus discípulos e, por extensão, a todos os que O seguem através dos séculos. Ele nos antecipa o propósito da história — encorajar-nos a não desistir na oração, mesmo quando a resposta parece tardia.
Aplicação:
Na alma cansada, no silêncio da noite, na espera sem fim, o crente deve seguir orando. Não por superstição, mas porque confia no Deus que ouve.
“Havia em certa cidade um juiz que não temia a Deus, nem respeitava homem algum.”
Exegese:
Jesus descreve um juiz corrupto, arrogante, desprovido de temor e compaixão — a antítese de um servo de Deus. Esta figura serve como contraste ao caráter de Deus. Se até esse juiz atenderá ao pedido de alguém, quanto mais o Pai amoroso?
Culturalmente, o juiz representava a autoridade suprema numa localidade. Era esperado que ele julgasse com justiça, mas este se afastava da Torá e do temor do Senhor.
“Havia também naquela mesma cidade uma viúva que vinha ter com ele, dizendo: Julga a minha causa contra o meu adversário.”
Exegese:
A viúva, figura recorrente nas Escrituras, representa os mais vulneráveis da sociedade (Êx 22:22; Tg 1:27). Sem marido, sem protetor, sem poder. Ela clama por justiça. Note o verbo “vinha ter com ele” no tempo contínuo — ela insistia, persistia.
Aplicação:
Ela nos ensina a orar com ousadia e constância. Mesmo quando os “poderosos” não nos escutam, devemos continuar levando nossa causa Àquele que julga retamente.
“Ele, por algum tempo, não a quis atender; mas, depois, disse consigo: Bem que não temo a Deus, nem respeito aos homens;”
Exegese:
O juiz revela sua natureza egoísta: não atende por dever, mas por incômodo. Ainda assim, Jesus usa essa figura para destacar que a persistência move até os insensíveis — quanto mais Deus, que é justo, será movido pelo clamor de Seus filhos.
“Todavia, como esta viúva me importuna, julgarei a sua causa, para não suceder que, por fim, venha a molestar-me.”
Exegese:
A expressão “me importuna” (em grego, hypōpiazē) carrega a ideia de golpear sob os olhos, como um soco. Trata-se de uma metáfora que indica exaustão e irritação. Ele julgará a causa não por justiça, mas para se livrar do incômodo.
Contraste: Deus, ao contrário, julga por amor e fidelidade, não por conveniência.
“Então, disse o Senhor: Considerai no que diz este juiz iníquo.”
Exegese:
Jesus convida os ouvintes à reflexão comparativa. Se até o juiz iníquo atende, quanto mais Deus, que é o oposto desse homem. Ele nos conduz ao raciocínio do “quanto mais”.
“Não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que a ele clamam dia e noite, embora pareça demorado em defendê-los?”
Exegese:
A pergunta é retórica e poderosa. Os “escolhidos” são os que pertencem a Deus — o povo da aliança, os redimidos. “Clamam dia e noite” — não por religiosidade mecânica, mas por desespero santo e fé inabalável.
A expressão “embora pareça demorado” (ou “ainda que tarde em responder”) aponta para a provação da fé. Deus ouve, mas há um tempo próprio para agir (cf. 2Pe 3:9).
Aplicação:
Nos momentos de silêncio divino, o justo não deve concluir que Deus se esqueceu, mas que Ele está preparando o momento certo para a resposta justa.
“Digo-vos que, depressa, lhes fará justiça. Contudo, quando vier o Filho do Homem, achará, porventura, fé na terra?”
Exegese:
Jesus afirma: Deus fará justiça — e depressa. “Depressa”, aqui, não significa necessariamente imediatamente, mas sim no tempo certo e com eficácia decisiva.
A pergunta final é profundamente escatológica:
Quando o Filho do Homem voltar, encontrará essa fé perseverante?
É uma convocação à vigilância e fidelidade. Ele não pergunta se encontrará culto, religião, ou milagres… mas fé — essa fé que insiste, clama, e não desiste.
Deus não se assemelha ao juiz iníquo, mas é amoroso, justo e atento.
A viúva perseverante é modelo de oração e fé ativa.
A parábola exorta o crente a não desanimar diante da aparente demora.
A fé que ora sem cessar é o verdadeiro tesouro que o Filho do Homem deseja encontrar ao retornar.
Lucas 18:3 apenas registra o pedido dela:
“Julga a minha causa contra o meu adversário.”
Não há detalhes sobre o tipo de litígio. Mas — ah! — não precisamos de detalhes jurídicos para entender a profundidade espiritual do clamor dela. O que nos é revelado é suficiente e significativo.
Na Palestina do primeiro século, a situação das viúvas era de extrema vulnerabilidade. Sem marido, muitas vezes sem filhos adultos que pudessem defendê-las, elas ficavam à mercê de aproveitadores. Era comum que:
Terras herdadas fossem disputadas ou usurpadas por parentes ou vizinhos.
Elas fossem enganadas em contratos ou dívidas.
Faltasse-lhes alguém que intercedesse por elas nos tribunais.
Assim, a “causa contra o adversário” pode ter sido:
Uma disputa de herança.
Uma acusação falsa ou injusta.
Um direito negado (por exemplo, uma casa, um campo, uma pensão).
Um malfeitor que abusava da ausência de proteção legal.
A linguagem usada por Lucas aponta para um conflito judicial sério, onde essa mulher não busca vingança, mas justiça.
A sabedoria de Jesus em deixar a causa da mulher em aberto é preciosa:
Ele abre espaço para que todo e qualquer clamor por justiça se veja representado nela.
Ela representa:
O oprimido que clama por socorro.
O injustiçado que suplica por reparo.
O servo de Deus que persevera mesmo sem respostas imediatas.
Em figura, esta viúva é a Igreja, que clama dia e noite:
“Maranata! Vem, Senhor Jesus!”
Ela é também o crente aflito, em lágrimas, com o joelho no chão, diante do silêncio do céu — mas que não desiste, porque sabe que Deus não é como o juiz iníquo. Ele virá, e não tardará.
Irmãos amados, há tempos em que o céu parece de bronze…
A oração sobe, mas não volta resposta.
Os olhos do crente se enchem d’água, e os joelhos se dobram dia após dia.
É para esses tempos que Jesus contou essa parábola.
“Sobre o dever de orar sempre e nunca esmorecer.”
(Levante levemente a voz com ternura: “nunca esmorecer!”)
Jesus, o Mestre por excelência, antecipa o propósito da parábola.
Não é sobre julgamento civil, nem política…
É sobre a alma que clama — e não desiste!
É sobre o crente que ora com lágrimas, com fé, com esperança.
[ENTONAÇÃO – Firmeza com ternura:]
“Disse-lhes Jesus uma parábola sobre o dever de orar sempre…”
([gesto de mãos erguidas como quem insiste no clamor])
“…e nunca esmorecer.”
([levar a mão ao peito com ênfase])
Jesus apresenta um juiz que:
Não temia a Deus – era ímpio;
Nem respeitava os homens – era insensível.
E no outro canto da cena? Uma viúva, símbolo da vulnerabilidade.
Mas… que mulher!
Ela insiste! Ela volta! Ela suplica!
Dia após dia! Semana após semana!
[ENTONAÇÃO – com intensidade crescente:]
“Julga a minha causa!”
“Julga a minha causa!”
“Julga a minha causa!”
([andar para frente a cada repetição, como quem implora diante do juiz])
E o juiz?
Não por justiça, mas por incômodo…
Ele atende.
Se até o juiz injusto atendeu, quanto mais o nosso Deus!
Ele não se cansa, não se esquece, não ignora.
Ele é o Pai dos órfãos, o Defensor das viúvas.
A resposta pode parecer tardia, mas Ele vem…
E quando vier, será com justiça!
[ENTONAÇÃO – com voz firme, proclamadora:]
“Não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que a Ele clamam dia e noite?”
“Digo-vos: DEPRESSA lhes fará justiça!”
([gesto com o dedo em riste para o alto, olhos erguidos])
Aqui Jesus vira o foco.
Não pergunta mais sobre o juiz…
Agora Ele olha para nós.
[ENTONAÇÃO – pausada, reflexiva:]
“Quando o Filho do Homem vier…”
([pausa])
“…porventura achará fé na terra?”
Ah, irmãos…
Fé que ora.
Fé que insiste.
Fé que resiste ao silêncio.
Fé que não se cansa de esperar.
Ore, mesmo que o céu pareça mudo.
O silêncio não é ausência — é prova de fé.
Clame como a viúva:
Com fé, com lágrimas, com persistência.
Confie no tempo de Deus.
Ele não age tarde — Ele age certo.
Seja achado em oração.
Quando Cristo voltar, que te encontre de joelhos — não em desespero, mas em fé.
Você está cansado?
Sente-se como a viúva?
Tem orado por algo há muito tempo — e parece que nada muda?
Jesus sabe. Ele contou esta parábola por você.
Não para que desista, mas para que persevere!
[ENTONAÇÃO final – suave e firme, com voz de pastor que cuida:]
“Clama a mim, e responder-te-ei.” (Jr 33:3)
“Ainda que pareça tardio, espera-O.” (Hc 2:3)
“O justo viverá pela fé.” (Hb 10:38)
Senhor, ensina-nos a orar como a viúva…
A clamar com fé, mesmo no silêncio…
A confiar na Tua justiça, mesmo quando tarda…
E, acima de tudo, que quando voltares —
Encontres fé em nossos corações.
Em nome de Jesus. Amém.